Opinião

A COVID-19 mudará nossa maneira de trabalhar?

Nossa área de IPS explora como o trabalho em escritórios corporativos está sendo afetado e como as empresas da América Latina podem aproveitar a situação para melhorar a produtividade e a experiência dos funcionários.

18 de Novembro de 2020

A maneira como trabalhamos será alterada? Se sim, como e quanto? Estas são as perguntas que nos fazemos quando observamos a mudança em nosso ambiente de trabalho nos últimos meses. De uma semana para outra, milhões de pessoas em todo o mundo precisaram levar suas atividades profissionais para casa, algo impensável para muitos empregadores até alguns meses atrás. Agora, enquanto as economias dos países europeus e asiáticos iniciam seu processo de adaptação a uma nova realidade, a questão que se coloca é: a América Latina está preparada para as mudanças que surgirão pós-pandemia?

Home office na América Latina

Em uma pesquisa realizada na América Latina com nossos funcionários, descobrimos que aproximadamente 50% dos nossos colegas não desempenhavam em Home Office nenhum dia. Isto é apenas metade da história. De acordo com um estudo realizado pela Citrix México em seis países da região (Colômbia, Argentina, México, Chile, Brasil e Peru), menos de 50% dos trabalhadores têm a possibilidade de trabalhar em casa. Em alguns países, como Brasil e Peru, o índice é menor que 25%. 

Para Gustavo Gomez, vice-presidente e diretor geral para a região norte da AT&T no México, em países como os nossos, o home office não é apenas um desafio tecnológico, mas também social, pois expõe ainda as lacunas da desigualdade ao acesso digital. Nem todas as empresas podem investir em infraestrutura para ter dispositivos com acesso a uma conexão segura para proteger suas informações. Além disso, há o fator relacionado ao capital humano. A implementação de políticas de trabalho flexíveis requer um processo de transição que garanta que os trabalhadores possam e saibam usar as novas ferramentas e, claro, o apoio das empresas. Um processo de mudança estabelece as bases para desenvolver e implementar as diretrizes, políticas, comunicação e infraestrutura necessárias. A próxima pergunta a responder será como fazer um uso mais eficiente de nossos escritórios em uma nova modalidade de trabalho.

No IPS, estamos convencidos de que reuniões espontâneas e tempo presencial são fundamentais para aumentar a produtividade e a inovação. É por isso que optamos por um esquema flexível que, ao mesmo tempo que permite que os trabalhadores trabalhem em casa, também promove o compartilhamento de espaços concebidos especialmente para o tipo de atividades que realizam. Isso tem uma vantagem não só em termos de custos imobiliários, mas também na atração e retenção de talentos e, claro, no bem-estar característico dos latino-americanos a partir das conexões estabelecidas uns com os outros. 

Não é surpresa que na América Latina a conexão com nossos colegas e círculos sociais seja uma parte fundamental da maneira como trabalhamos e vivemos. De acordo com o Happy Planet Index (conteúdo em inglês), a região ocupa seis dos dez melhores lugares nesta escala, o que, entre outras coisas, mede o bem-estar.

O retorno a curto prazo

Como resultado da pandemia, vários países estão criando esquemas para o retorno seguro aos escritórios de tal forma que uma distância saudável seja mantida e a atividade econômica possa ser recuperada. E enquanto esses esquemas são claros  no que se refere ao que buscam alcançar, como implementá-los corretamente permanece um mistério para a maioria.

Carlos Kolmans, diretor regional de Integrated Portfolio Services da JLL na América Latina, área dedicada à consultoria especializada em imóveis, prevê uma diminuição na densificação dos espaços, priorizando a saúde dos funcionários e a reputação das empresas. Ele comenta que, embora possa haver incerteza para os usuários, ela será dissipada, pois as ações impostas pelos governos e empresas têm resultados efetivos, e os próprios usuários buscam restaurar laços sociais tão característicos dos negócios da região. As mudanças mais significativas serão feitas pelas empresas. Ele compartilha que “antes dava muito trabalho convencer os  comitês executivos de que havia uma mobilidade natural, e que eles poderiam aproveitar os espaços não utilizados dos escritórios, que na América Latina totalizam até 40%. Atualmente esses mesmos comitês acham que não precisam de escritórios e que a produtividade dos funcionários é mantida ou muito semelhante a estar no escritório sem investir no espaço físico.”

Isto significa que, pelo menos por enquanto e nos primeiros anos, o nosso retorno ao novo normal certamente será limitado, com controles sanitários, acesso e turnos escalonados para muitos trabalhadores.

A equipe de pesquisa da JLL recomenda prestar atenção a quatro áreas para tornar fazer com que o retorno seja mais simples: 

  • Preparação do negócio para reiniciar as atividades tendo em conta novas cadeias de suprimentos.
  • O recurso humano deve ter prioridade em questões de proteção e bem-estar para garantir a produtividade.
  • O impacto financeiro será multifacetado. Devem ser contemplados os custos de emergência sanitária, planos de mitigação e resiliência, bem como soluções, capacitação e recuperação.
  • A comunicação organizacional é essencial para proporcionar transparência. Para isso, protocolos e diretrizes claras devem ser estabelecidos para a força de trabalho, clientes e parceiros.

Para a nossa equipe de Pesquisa e Estratégia, o foco não deve ser voltar ao escritório o mais rápido possível, mas perguntar o que é necessário para que as instalações possam trazer de volta seus funcionários, retornar a uma atividade comercial estável e também saber quais são as áreas essenciais que devem voltar primeiro. Isso também dependerá das políticas e medidas que cada país tem tomado. Além disso, observam que, a curto prazo, é esperado um abrandamento da atividade de investimento. São observados atrasos nos lançamentos e os longos prazos nas transações estão se tornando cada vez mais evidentes, consequências das medidas de saúde implementadas para conter a propagação do vírus.

O futuro do trabalho

Até agora, falamos sobre as vantagens do home office e a importância de planejar um retorno com medidas de distanciamento e higiene, mas o que acontecerá a longo prazo, quando a pandemia terminar?

Carlos Kolmans menciona que ocorrerão gradualmente duas coisas que vão inovar os escritórios. Primeiro, a descentralização de espaços de escritório, o que significará que, enquanto as matrizes continuarão com atividades como visitas de clientes, treinamentos, reuniões e outras atividades colaborativas, os funcionários terão a possibilidade de trabalhar de qualquer lugar. Além disso, teremos uma força de trabalho mais líquida, focada em projetos em vez de trabalhos rotineiros. Este capital humano será também adaptado às necessidades de curto e médio prazos das empresas, assistidas pela descentralização do espaço físico. Finalmente, ele menciona que isso irá variar muito de empresa para empresa, dependerá do quão avançadas elas sejam e do capital que elas têm para investir nessas iniciativas.

A este respeito, Christian Beaudoin, diretor de Pesquisa & Estratégia da JLL em Chicago, menciona que não haverá maneira uniforme de trabalharmos no futuro. Será um processo gradual que irá variar de acordo com a região, país, cidade e empresa.

Home office não é para todos, nem será permanente para a maioria. De acordo com um estudo realizado por sua equipe, apenas 5% indicou a preferência por trabalhar remotamente de forma permanente. A mesma pesquisa relatou que 65% das pessoas preferem escolher quando trabalhar em casa ou no escritório. Isso coincide com o estudo latino-americano onde 46% dos trabalhadores escolheriam trabalhar em casa com base na necessidade, em contraste com os 5% que gostariam de fazer home office mais de 15 dias por mês.

O segredo reside, então, em obter o melhor dos dois mundos. Oferecer aos trabalhadores a opção de escolher onde trabalhar não só ajudaria a melhorar a satisfação dos funcionários, como também é um fator para aumentar a colaboração formal e espontânea, aumentar a troca de ideias, reduzir os custos imobiliários e pode ser usado como um fator diferenciador para atrair mais e melhores talentos, bem como para retê-los.

Esta é uma tendência que já estava em ascensão antes da pandemia. Especificamente, para inovar as pessoas devem ser capazes de sentar, conversar, compartilhar ideias, criar projetos juntos e se comunicar presencialmente. Por outro lado, a cultura de uma organização é criada quando as pessoas se encontram, compartilhando um espaço no qual elas podem dar suas opiniões, criar atividades para suas equipes e definir regras. Isso dificilmente será substituído por videoconferência ou atividades remotas.

Finalmente, nos tempos disruptivos em que vivemos, é necessário ter uma comunicação direta com os nossos colegas, especialmente em momentos de incerteza como o atual, mas sempre buscando inovações tecnológicas e criando novos serviços.

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